Mind Clearing

Read it in English

Essa semana mostrei meu solo em processo para Dominique Rivoal. Ela trabalha aqui na Middlesex University como técnica e tem interesse na interação entre dança, movimento e terapia. Nos conhecemos semanas atrás nas aulas que ela ofereceu como convidada na disciplina de Improvisação que a Profa. Vida Midgelow vem oferecendo para a Graduação em Dança. Conversamos então sobre interesses de pesquisa, sobre a diversidade de possíveis atuações no campo da Dança e decidimos marcar um encontro prático para compartilhar experiências.

Combinamos previamente que eu mostraria minha prática para ela e que ela pensaria em algo para compartilhar ou propor também. Já no Studio de dança da universidade, conversamos sobre a questão e os problemas da formação acadêmica em dança enquanto eu preparava as cordas, a câmera e uma possibilidade de figurino que queria experimentar. Dominique também preparou a câmera dela para filmar minha performance e disse que ia decidir o que propor depois, a depender do que visse de minha proposta.

Ao todo, minha performance durou cerca de 40 minutos. Em seguida [e após eu descansar por alguns breves minutos], ao invés de tecer comentários, Dominique propôs me fazer perguntas. O que está claro sobre sua performance? O que não está claro sobre a sua performance? E novamente: o que está claro? o que não está claro? E novamente…. E novamente…

A cada refazimento da pergunta e a cada refazimento das respostas coisas novas surgiam em minha mente, respostas anteriores eram descartadas ou postas em outras palavras, como uma escavação da experiência em uma busca pelo que realmente importa. Em alguns momentos, Dominique mudava ligeiramente as perguntas; ao invés de perguntar o que estava claro sobre minha performance, ela perguntava o que estava claro sobre as cordas, por exemplo, ou o que não estava claro sobre a relação com o público.

Com sua sensibilidade e escuta atenta, Dominique então foi conduzido uma conversa [que infelizmente não gravei] a partir do que eu articulava em minha fala, tendo na repetição das perguntas uma espécie de norte metodológico para a articulação da prática.

Nossa conversa me fez lembrar bastante do Processo de Articulações Criativas de Vida Midgelow e Jane Bacon e do Processo de Resposta Crítica de Liz Lerman. Nos três casos, há a ideia de que as soluções vindas do exterior podem ceder um pouco mais de lugar à articulação que o próprio artista faz sobre seu trabalho, encontrando, com isso, soluções ou mesmo detectando impasses, problemas que podem colaborar para a continuidade do processo criativo.

Dominique se baseou em técnicas terapêuticas de Mind Clearing, desenvolvidas por Charles Berner entre os anos 1950 e 70 e depois por Lawrence Noyes desde os anos 1980 até os dias atuais. O que senti foi que, durante o exercício, enquanto eu falava, algumas “fichas” iam caindo sobre minha própria proposta artística e isso, a meu ver, pode me possibilitar continuar em processo e criar de outros modos, com outra consciência.

Depois de permanecer somente com as perguntas e dando espaço para minhas respostas e articulações [o que acredito ter durado uma hora], Dominique fez sua própria leitura sobre minha apresentação, as sensações e imagens que surgiram para ela, os pensamentos que foram suscitados ao me ver dançar.

Deixo aqui algumas palavras que Dominique me deu sobre o que viu em minha performance e que anotei, soltas, em meu caderno.

  • a imagem de um ninho
  • uma xamã
  • uma procura, uma busca
  • pensar com o corpo
  • tornar-se consciente do espaço externo
  • permitir o movimento e fazer o movimento – um jogo
  • o cabelo no rosto – estar sem rosto – o inumano – a coisa
  • vulnerabilidade
  • fronteira
  • experiência

No fim, Dominique me fez uma pergunta que a princípio me pareceu boba, mas a tentativa de respondê-la mexeu demais comigo. A pergunta era simplesmente: qual é a mensagem da sua performance? E minhas respostas vieram nessa ordem: “não há mensagem, só a experiência”; “eu sou uma mulher”; “eu sou um corpo”; “eu estou aqui”, “eu estou aqui como sou”, “eu sou mais que um corpo”.

English version

I showed my solo in process to Dominique Rivoal this week. She works at Middlesex University as a technician and is interested in the interaction between dance, movement and therapy. We met weeks ago in the classes she offered as a guest in Profa. Vida Midgelow Improvisation classes for the undergraduate Dance course. Then we talked about research interests, about the diversity of professional development in Dance field and decided to make a practical meeting to share experiences.

We previously agreed that I would show my practice to her and that she would think of something to share or propose as well. Already at the University Dance Studio, we talked about problems and concerns of academic dance training while I was preparing the strings, the camera and an outfit possibility that I wanted to try out. Dominique also prepared her camera to record my performance and said she would decide what to propose later, depending on my practical proposal.

My performance lasted about 40 minutes. After I did it [and after I rest for a few brief minutes], Dominique proposed to ask me questions instead of commenting. What is clear about your performance? What is unclear about your performance? And again: what is clear? What is unclear? And again …. And again … Same questions.

In every repetition of the questions, and each time I’ve tried to give her answers, new things came into my mind. In the process, previous answers were discarded or replaced in other words. It was like digging my experience into a searching for what really matters. At some moments Dominique also changed the questions slightly. So instead of asking what was clear about my performance, she asked what was clear about the strings, for example, or what was unclear about my relationship with the audience.

With her sensitivity and attentive listening, Dominique then conducted a conversation [which I unfortunately did not record] from what I articulated in my speech, having in the questions repetition a kind of methodological north for the practice articulation.

Our conversation reminded me a lot of Midgelow and Jane Bacon’s Creative Articulation Process (CAP) and Liz Lerman’s Critical Response Process. In all three cases, there is the idea that external solutions should give a little more space to the artist own articulations in order to find solutions or even detect conflicts or problems that can affect the creative process continuity.

In this exercise, Dominique was inspired by some Mind Clearing therapeutic techniques developed by Charles Berner between the 1950s and 70s and later by Lawrence Noyes from the 1980s to the present day. What I felt was that, as I spoke, some “clicks” happened on my own artistic proposal. And this kind of practice, in my point of view, can enable me to move on in the process and to find another ways to create, with another awareness.

After remaining with only the questions and giving space for my answers and articulations, Dominique made her own reading/comments about my presentation, the sensations and images that arose for her, the thoughts she had while seeing my dancing.

I leave here a few words Dominique gave me about what she saw in my performance and I loosely wrote down on my notebook.

  • the image of a nest
  • a shaman
  • it’s like a searching
  • thinking with the body
  • becoming aware of the environment
  • a game between allowing and making movement
  • the hair on the face – being faceless – not human – a thing
  • vulnerability
  • edge
  • experience

In the end, Dominique asked me a question that at first seemed silly to me, but the attempt to answer her stirred me very much. The question was simply: What is the message of your performance? And my answers came in this order: “there is no message, only experience”; “I am a woman”; “I am a body”; “I am here”, “I am here as I am”, “I am more than a body”.

 

2 thoughts on “Mind Clearing

  1. Gostei da questão de perguntar e repetir a pergunta. É interessante em como a gente entra num processo de construção e desconstrução e como isso faz com que os pensamentos fluam. Tenho muita dificuldade de externalizar as coisas, mas vejo que essa articulação realmente é essencial para desenvolvimento da criação.

    Like

    1. Agora pensando junto com seu comentário: o interessante dessa experiência pra mim foi entrar em uma espécie de meditação com as palavras e permitir que as palavras me falassem sobre o que realmente me interessava dentro da criação. Vamos planejar um momento de compartilhamento de experiências esse ano ou ano que vem pra burilar melhor essas coisas. Beijo!

      Like

Leave a comment